sábado, 24 de outubro de 2009

Witch

Nós não temos o hábito de comemorar com fervor o dia das bruxas (Halloween), mas vale a lembrança deste paradoxo: Na pré-história, as bruxas eram mulheres sábias, que por conhecerem ervas medicinais e serem capazes de realizar partos e curar doenças, tinham grande importância para a comunidade. Mais tarde, com a substituição do pensamento mágico pelo pensamento teológico, elas passaram a ser consideradas más e foram duramente perseguidas. Supunha-se que eram enviadas do demônio e muitas foram queimadas vivas pela Santa Inquisição.

“Ora, pois”, que algumas enfermeiras não deixam de ser meio bruxas. Não é o meu caso, é claro. Tirando a infeliz coincidência de eu ter certa afinidade com a vassoura e ser má, as vezes, não, eu não faço partos e não curo doenças! Tenho me esforçado para ser uma enfermeira bastante estudiosa daquilo que gosto na minha profissão e isso é tudo. Estou, firmemente, convicta de que sempre temos algo mais para aprender e de que este aprendizado se dá em todos os espaços da vida cotidiana e com qualquer espécie da natureza, seja humana, animal, vegetal, mineral ou “sobrenatural”.

Ainda sobre a idiossincrasia da "enfermeira bruxa", proveniente do modelo mágico da época, a mulher, de maneira geral, ou era vista como o demônio que desvirtuava os homens (prostituta) ou como santa e pura (esposa dedicada ou caridosa cuidadora dos enfermos). O Creacionismo (Adão e Eva) dava todas as explicações sobre a vida e foi a partir daí que atribuiu-se ao gênero feminino o poder de instigar o pecado e o desejo, por meio da bruxaria. Acontece que a organização social, onde o Rei e o Clero se valiam da religião para detenção do poder, determinava que esta atitude fosse reprimida, a fim de prevenir o caos.

Deixando de lado a bela história e a filosofia curiosa da origem da profissão que escolhi, não são somente estes os motivos que me levaram a optar pela enfermagem. Não, eu também não ouvi nenhum chamado. Na verdade, me encantei pela profissão a medida que vivenciei seu aprendizado. Em alguns momentos tive ímpetos de desistir e hoje estou certa de que há mistérios, nesta escolha, que “vão muito além da nossa vã filosofia”. Todavia, uma outra face da enfermagem, que não tem a ver com a cura de doenças e nem tampouco com a bruxaria, tem despertado meu interesse. São outras possibilidades que se apresentaram durante a minha trajetória e que se mostram mais apropriadas à minha realização pessoal, como poder contribuir, mesmo que um pouco só, com a luta contra as desigualdades e injustiças, em nosso País. Então, cá estou eu as voltas com o estudo da Promoção da Saúde e da proposta de assistência à saúde dos brasileiros que, pouco a pouco, tem se consolidado, apesar das duras críticas e da falta de apoio da mídia.

Diante de tudo isso, eu não sou o que se pode chamar de uma "enfermeira padrão", mas tenho cá meus talentos e também, como qualquer bruxa que se preze, preparo alguns feitiços. Falando sério, agora, a enfermagem se consolidou como ciência e a mulher também se emancipou e já não sofre tanto com os estereótipos advindos da sua história de inferiorização. No dia de Halloween, quero lembrar que bruxas, santas, prostitutas, enfermeiras, todas nós trazemos na essência um pouquinho de cada uma e, afinal, “de enfermeiros e loucos, todos nós temos um pouco”!

Foto: Florence Nightingale, cuidando dos enfermos na Guerra da Criméia, em 1824. Ela iluminava o ambiente escuro com uma lamparina, daí o símbolo da enfermagem ser a lâmpada (viu Eder??).

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